(...)Ao conduzir um veículo de imprensa, seja ele qual for, lamenta-se
testemunhar cenas como as que vimos na última quinta-feira, 13 de junho
de 2013. Um fotógrafo do Portal Terra foi detido. Um repórter da
revista
Carta Capital, foi também detido por portar vinagre (para se proteger do gás lacrimogêneo).
O Vinagre, também chamado de Ácido Acético ou CH3COOH, tem grau de
ionização ridículo - é usado como tempero, não como arma. Quis o
destino, porém, que ele não fosse o tempero da Salada, mas o da
revolta.
Quis o destino que protestos como vimos na semana passada - e protestos
vindouros, como veremos a partir de segunda 17 de junho - ocorressem
numa época teoricamente calma na economia. O desemprego é o menor de
eras - está na casa dos 5%. O PIB cresce a passos curtos - mas cresce. O
que está acontecendo?
Acontece que isso tudo é uma cortina de gás - da mesma forma que o
lacrimogêneo lançado pela polícia - que cega o povo. Mas, no fundo,
dentro de nós mesmos, sabemos que algo está errado. Sabemos que essa
política do
pão e circo no fundo é um castelo de areia - que a menor das gotas transbordaria o copo.
O copo não tem só 20 centavos. Ou 3,20, como preferirem. O copo está
cheio há muito tempo, com os governos diuturnamente dando goles sociais
para que ele não transbordasse. Quis o destino que ele transbordasse à
beira do maior circo que o país já viu. Quer circo maior que o esporte?
Não, não é porque este site é de Futebol Americano que eu vou criticar o
Futebol a toa. Este site poderia ser do que fosse - mas é um veículo de
imprensa que sempre teve compromisso com a verdade. Mais do que isso: é
um dos poucos veículos cujo público é na casa de 80% de jovens entre 13
e 25 anos. Jovens estes que temperarão a salada daqui 20 anos neste
país. Ou, se preferirem, a chamada Geração de 1988.
Esta geração não apanhou da polícia, não viu general no planalto e não foi presa para averiguação. Esta geração não tolera esse tipo de coisa. Essa geração irá às ruas na próxima segunda.
"Mas agora chegou nossa vez,
Vamos cuspir o lixo em cima de vocês;
Somos os filhos da revolução,
somos burgueses sem religião"
Esta é a geração que vê todos os dias, ônibus lotados - e cuja tarifa só
encarece. Esta geração é a que vê hospitais lotados - e aqueles poucos
que podem pagar um seguro de saúde, veem o preço só encarecer. Esta
geração é a que vê a máscara de fumaça chamada ENEM - que ano após ano
apresenta problemas. Esta geração é a que vê as universidades federais
em greve. Esta geração cansou.
O processo de revolta que toma conta do Brasil tem gênese parecida aos
da Turquia. Lá a coisa começou pelo fim de uma área verde para a
construção de um shopping. Aqui, por 20 centavos. Ou 10 centavos de
dólar. Ou 7 centavos de euro. Pode parecer miséria, pode parecer
metáfora - mas é exatamente uma gota de vinagre num mar de salada
podre.
E, enquanto isso, essa geração vê elefantes brancos com legislação
estrangeira. Vê a proibição de beber, comemorar, de levar um pandeiro
para o estádio. Vê a FIFA lucrando, vê estádios sendo superfaturados. Vê
a prostituição - moral e real - deste país a quem não é deste país. Ao
mesmo tempo, aqueles que já foram jovens, portam-se como velhos.
Dilma Rousseff já foi presa. Aloísio Nunes e Fernando Haddad já
estiveram envolvidos com o movimento estudantil enquanto acadêmicos de
Direito da Universidade de São Paulo, como este que os escreve. De toda
sorte, ambos evocam palavras contra a baderna e exaltam posições legalistas, do Estado de Direito (sic) . O que parecem ter esquecido é o que a Geração de 1988 tem ao seu lado na Constituição Federal.
"Art. 1º A República Federativa do Brasil,
formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal,
constitui-se em Estado Democrático de Direito [...]
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo"
Vocês são o povo. Nós somos o povo. Àqueles que achavam que a juventude
deste país nunca se mobilizava por nada, a o vinagre deu o tempero que
precisava. Àqueles que dão risadas com as borduadas, saiba que borracha
nenhuma vai apagar o sentimento de um futuro melhor. Porque país
desenvolvido não é só país com economia estável. É país que respeita os
Direitos Humanos, é país com um social desenvolvido. E isso,
infelizmente, não temos aqui (ainda). Mas se você sair às ruas, quem
sabe?
(...) E a
você, que torceu o nariz para tudo o que foi tido aqui, termino este
texto com uma frase de Bertold Brecht.
"Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento.
Mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem"